quarta-feira, maio 31, 2006

Fogo

segunda-feira, maio 29, 2006

Uma Face

O fogo irrompeu da singularidade e no trigésimo primeiro degrau os anjos ofereceram imagens ao Homem. Quis o Homem ver os anjos que falavam pela boca dos Sábios, pela boca daqueles que viam na natureza o Amor, filho da ordem divina, sentido pelo Homem a cada nascer do sol.

Disse um Anjo a um Homem para subir ao trigésimo segundo degrau e aí enfrentar a foice do tempo. Vencendo este confronto será digno então de compreender toda a máquina que move o universo e aí, o sonho será a verdade e o reino uma verdade que cristalizou a face dos Anjos.

Mem Gimel

quinta-feira, maio 25, 2006

Yesod




Caminho


Mem Gimel

sexta-feira, maio 19, 2006

tempos que correm

Hoje decidi roubar um pouco de tempo ao tempo para escrever.

Entre assuntos que podemos escrever e conversar, os mundanos são aqueles que mais facilmente são compreendidos e os quais agregam mais opiniões concordantes. Temos de aprender através da presença no plano físico e essa é a nossa sina.

Desde que nascemos até à data da nossa morte, aprendemos. Entre verdades, ou semi-verdades e mentiras ou semi-mentiras, construímos em torno de nós uma personalidade que nada mais é do que um casaco da nossa individualidade. Assim, neste mundo físico, somos “iniciados” no aspecto físico das leis que o governam.

Tudo se inicia quando crianças. Olhamos para dois objectos e distinguimos a ambos. Entretanto surge alguém que nos diz que são arvores de fruto e também seres vivos. Olhamos novamente para as arvores que se encontram diante de nós e no pouco espaço decorrido já as vemos de uma forma diferente. – A fruta é boa -> a arvore é boa, Uma simples associação. Mais tarde surge alguém que nos ensina a operação adição, o seu significado a nível abstracto, então, de um momento para o outro surge a definição de elementos e conjuntos. Podemos até dizer que compreendemos o que é a unidade.

Assim aprende o Homem a definir o universo, com aquilo que ele sente, com aquilo que é manifesto. Um conhecimento guardado algures na mente, acessível pelo esforço da vontade sempre que necessita de justificar, compreender, interpretar aquilo que se manifesta perante si.

O tempo decorre e a determinada altura ouve falar de Deus e de um instante para o outro, vê o seu mundo interior a ser dominado por evangelhos, cartas e vozes de homens vestidos ora de negro, ora de branco, que ao contrário dos mestres e professores que leccionam o mundo exterior mostrando-o de forma a que o Homem o compreenda e nele se sinta livre, de uma forma subtil, qual cunha que provoca uma falha e uma quebra, penetram no espírito e tornam o mesmo vassalo de uma ideia dita por eles como sendo a única e a verdadeira . Acredita porque tens de acreditar, é lhe dito de uma forma indirecta. Como aquela experiência que fizeram ao macacos. Colocando uma banana no topo de uma escada, sempre que um macaco subia para ir buscar a banana, todos eles eram molhados com um jacto de água. Isto aconteceu por um período de tempo até que os macacos deixaram de subir a escada. Retiraram um dos elementos do primeiro grupo e colocaram um novo. O novo tentou subir, mas os restantes logo o impediram agredindo-o. Passado tempo o novo deixou de subir a escada, nunca levando com o jacto de água, um a um os macacos do primeiro grupo foram retirados até já não restar nenhum e substituídos por novos. Os novos por sua vez nunca levaram com o jacto de água mas impediam sempre os mais recentes de subir a escada. O mesmo é dizer, acredita, mas não contestes porque sempre foi assim.

A consciência de um mundo interior do Homem ocidental, ao contrário da consciência do mundo exterior, como na experiência dos macacos, é tratada da mesma forma por esses ditos mandatários de Deus. E sobre a potência de Rituais como missas, reuniões, eucaristias, etc..a liberdade do espírito de cada um é controlada em vez de ampliada. É oferecido a cada um o alimento de que cada um é filho de um Deus e que esse Deus irá cuidar bem do seu filho. È dito, pratica o Amor e assim a própria pessoa é enjaulada em si mesma sem nunca ser iniciada nos mistérios do próprio Amor, sem nunca ser iniciada nos mistérios da mente, como foi para os mistérios do corpo, sem nunca compreender o que é que contém em si mesma, satisfeita apenas por saber que é filho de Deus, limitando-se a viver e a cumprir o que os reis da igreja lhes ordenam, aceitando quais ovelhas as ordens de um pastor. Coitadas destas pessoas que possuem um bom coração.

Nada pode ser feito de bom sem se saber o que se há de fazer, sem saber até o que é o bem.

Defende então este Homem um Deus, que é um ser supremo sentado num trono, algures num mundo diferente deste mesmo e para este mesmo Homem basta-lhe saber isso, enganando-se a ele mesmo. Questionado acerca de temas mais filosóficos, refugia-se em escrituras, dando respostas que em analogia com o mundo físico são impossíveis, mas nesta impossibilidade encontra ele o poder de Deus.

Morre o Homem sem se dar conta que de alguma forma tudo tem de ser contínuo e mesmo no espaço existente entre um salto quântico alguma substância mesmo que subtil e não entendida no nível de consciência normal, tem de existir. Pois, só assim o conceito de unidade atribuído a um princípio gerador, omnipotente e omnipresente é possível. Apenas isto faz com que Homem esteja para Deus como o corpo está para a mente.

Hoje em dia sente-se que paira uma ideia no ar de que algo está errado, que alguma coisa está não certa na grande igreja ocidental que se ergueu. Mas estas vozes que se erguem hoje e tentam retirar o véu, sempre se levantaram ao longo do tempo, a diferença é que nos dias de hoje o Homem conquistou um certo nível de liberdade e o numero de pessoas que possuem a capacidade de reflectir devido ao conhecimento mais desenvolvido que possuem é em larga escala superior, em relação ao o numero de eruditos de há 2000 anos atrás. Ainda mais que hoje em dia não correm o risco de sentir o fogo a queimar-lhe o corpo, não correm o risco de sentir o seu corpo a ser dilacerado em praça publica, acusado de heresia. Assim sendo, o bradar destas vozes volta de novo a ouvir-se e resta-nos a esperança que desta vez seja mais poderoso que a chamada santa inquisição.

Essa ideia que surge por todos os meios, televisivos, literatura, etc.. fala-nos de algo oculto, de uma verdade oculta. Vêem-se pessoas a perseguir pinturas, formulas hebraicas, símbolos estranhos, tentando compreender a alquimia, magias, sociedades secretas. O que acontece no final é que se duvidas existiam, ainda mais duvidas ficaram.

Mas a única verdade é que nada é oculto. Tudo está diante de todos, mas acontece que a consciência superior do Homem na maior parte dos casos não foi treinada, como foi a consciência sensitiva. Esta consciência superior é como um bebé, que necessita crescer, aprender para que se possa expandir. O que acontece é que o homem não conhece “as operações interiores” de forma a associar elementos abstractos, da mesma forma que conhece as operações exteriores onde por exemplo adiciona arvores de fruto, surgindo à mente a ideia de pomar.

É o conhecimento das operações interiores que a igreja teme. Porque quando a humanidade tomar esta consciência, Os principais dogmas sob os quais a igreja assenta, vão cair.

Da parte não se deve fazer o todo. Um mestre nunca deve ter o receio que o seu discípulo seja superior a ele, porque quem tem a ganhar é a Humanidade porque é do Homem todo o conhecimento e não somente de alguns.

O caminho está em cada um. Arrancai todas as ideias pré concebidas. Botai fogo no vosso campo e caí no fundo do poço de vós mesmos porque nas trevas irá surgir a luz, porque no campo queimado irá surgir uma nova colheita.

Olhai para os símbolos e aceitai-os não com a critica da ideia pré concebida, mas de espírito aberto, aos poucos ireis aprender a somar.

Mem Gimel

sexta-feira, maio 12, 2006

Morte

“ O Universo é mudança; cada mudança é o efeito de um Acto de Amor; todos os Actos de Amor contêm alegria pura.
Morre diariamente.”

Aleister Crowley

quarta-feira, maio 10, 2006

O Sonho

O mundo é o corpo do sonho.

O amor e a raiva que surgem nas palavras que formam um poema ou nas cores de uma tela, são os mesmos, amor e ódio, que surgem entre os Homens.

Conhece o Homem a mãe que o gerou e chama a mesma pelo nome de Natureza. Conhece o Homem o pai que a fecundou e chama o mesmo pelo nome de Deus.
Não conhece o Homem o seu irmão pois desconhece a sua semelhança.

Em tudo são diferentes, por isso odeiam-se.
São semelhantes numa coisa, por isso amam-se, na consciência.

Mem Gimel

quinta-feira, maio 04, 2006

O Reino

O que vejo neste mundo!

O reino do Eu. Um reino que perdeu a coroa. Um reino moribundo. Em cada esquina, em cada praça, em cada cidade, em cada país surge o Eu sofro, Eu estou triste, Eu tenho raiva, Eu estou sentido, Eu fui esquecido, Eu confesso as minhas mágoas, Eu estou alegre…

Almas perdidas sob o peso dos sentidos. Almas que se julgam ser o corpo. Almas que se identificam com o produto do tempo e assim, incapazes de escapar ao sofrimento e à dor.

Gostava de ver e ouvir, Eu partilho o meu Ouro.

Que ouro? Perguntam.

Eu partilho aquilo que sei, com amor, para ajudar o meu próximo a erguer o seu templo interior, para erguer a sua vontade de lutar e construir o mundo. Nesta partilha aquele que dá recebe em triplicado.

Nenhum pai fica o resto da sua vida a contemplar o filho. Que maior prazer pode ter o pai senão o de transmitir com Amor aquilo que sabe, para que o seu filho cresça no conhecimento!?

Todo o Homem possuí à sua maneira o seu ouro, algo que pode transmitir e que pode levar alguém a sorrir.

O mundo está cheio do Eu fiz, Eu faço, Eu vi…
O mundo está cheio de contemplações vazias…
O mundo está cheio de visões pessoais…

Peguem num pincel e ensinem alguém a pintar e sorriam com esse alguém.
Peguem na palavra e ensinem alguém a falar e sorriam com esse alguém.
Peguem no sonho e ensinem alguém a sonhar e sorriam com esse alguém.
Peguem no amor e ensinem alguém a amar e sorriam com esse alguém.

O seguinte paragrafo foi retirado do Evangelho de Filipe. O simples acto de o colocar na mente e com este escrito navegar no seu sentido, transmite a visão daquilo que cada um deveria ser.

“ A Fé recebe, o Amor dá. Ninguém poderá receber senão tiver Fé. Ninguém será capaz de dar sem Amor. Por esta razão, para que realmente possamos receber, cremos e para que possamos amar, damos, pois se alguém dá sem Amor não recebe o beneficio pelo que deu.” Evangelho de Filipe


Mem Gimel

quarta-feira, maio 03, 2006

Evangelho de Tiago

EVANGELHO DE TIAGO

I
Segundo narram as memórias das doze tribos de Israel, havia um homem muito rico, de nome Joaquim, que fazia as suas oferendas em quantidade dobrada, dizendo:
- O que sobra, ofereça-o para todo o povoado e o devido na expiação de meus pecados será para o Senhor, a fim de ganhar-lhe as boas graças.
Chegou a grande festa do Senhor, na qual os filhos de Israel devem oferecer os seus donativos. Rubem pôs-se à frente de Joaquim, dizendo-lhe:
- Não te é lícito oferecer as tuas dádivas, enquanto não tiveres gerado um rebento em Israel.
Joaquim mortificou-se tanto que se dirigiu aos arquivos de Israel, com intenção de consultar o censo genealógico e verificar se, porventura, teria sido ele o único que não havia tido prosperidade em seu povoado.
Examinando os pergaminhos, constatou que todos os justos haviam gerado descendentes. Lembrou-se, por exemplo, de como o Senhor deu Isaac ao patriarca Abraão, nos seus derradeiros anos de vida.
Joaquim ficou muito atormentado, não procurou a sua mulher e retirou-se para o deserto. Ali armou a sua tenda e jejuou por quarenta dias e quarenta noites, dizendo:
- Não sairei daqui nem sequer para comer ou beber, até que me visite o Senhor meu Deus. Que as minhas preces me sirvam de comida e de bebida.

II
Ana lamentava-se e gemia dolorosamente, dizendo:
- Chorarei a minha viuvez e a minha esterilidade.
Chegou, porém, a grande festa do Senhor e disse-lhe Judite, a sua criada:
- Até quando vais humilhar a tua alma? Já é chegada a festa maior e não te é lícito entristecer-te. Toma este lenço de cabeça, que me foi dado pela dona da tecelagem, já que não posso cingir-me com ele por ser eu de condição servil e levá-lo ao selo real.
Disse Ana:
- Afasta-te de mim, pois que não fiz tal coisa e além do mais, o Senhor já me humilhou em demasia para que eu o use. A não ser que algum malfeitor o haja dado e tenhas vindo para fazer-me também cúmplice do pecado.
Replicou Judite:
- Que motivo tenho eu para maldizer-te, se o Senhor já te amaldiçoou não te dando fruto de Israel?
Ana, ainda que profundamente triste, despiu as suas vestes de luto, cingiu-se com um toucado, vestiu as suas roupas de bodas e desceu, na hora nona, ao jardim para passear. Ali viu um loureiro, assentou-se à sua sombra e orou ao Senhor, dizendo:
- Ó Deus de nossos pais! Ouve-me e bendiz-me da maneira que bendisseste o ventre de Sara, dando-lhe como filho Isaac!

III
Tendo elevado os seus olhos aos céus, viu um ninho de passarinhos no loureiro e novamente lamentou-se dizendo:
- Ai de mim! Por que nasci e em que hora fui concebida? Vim ao mundo para ser como terra maldita entre os filhos de Israel. Estes cumularam-me de injúrias e escorraçaram-me do templo de Deus. Ai de mim! A quem me assemelho? Não às aves do céu, pois elas são fecundas em tua presença, Senhor. Ai de mim! A quem me pareço? Não às bestas da terra, pois que até esses animais irracionais são prolíficos ante os teus olhos, Senhor. Ai de mim! A quem me posso eu comparar? Nem sequer a estas águas, porque até elas são férteis diante de ti, Senhor. Ai de mim! A quem me igualo eu? Nem sequer a esta terra, porque ela também é fecundada, dando os seus frutos na ocasião própria e te bendiz, Senhor.

IV
Eis que lhe apareceu um anjo de Deus, dizendo-lhe:
- Ana, Ana, o Senhor escutou os teus rogos! Conceberás e darás à luz e da tua prole se falará em todo o mundo.
Ana respondeu:
- Viva o Senhor meu Deus, que, se chegar a ter algum fruto de bênção, seja menino ou menina, levá-lo-ei como oferenda ao Senhor e estará a seu serviço todos os dias de sua vida.
Então vieram a ela dois mensageiros com este recado:
- Joaquim, o teu marido, está de volta com os seus rebanhos, pois que um anjo de Deus desceu até ele e disse-lhe que o Senhor escutou os seus rogos e que Ana, a sua mulher, vai conceber em seu ventre.
Tendo saído Joaquim, mandou que os seus pastores lhe trouxessem dez ovelhas sem mancha.
Disse ele:
- Estas serão para o Senhor.
Mandou, então separar doze novilhas de leite, dizendo:
- Estas serão para os sacerdotes e para o sinédrio.
Finalmente, mandou apartar cem cabritos para todo o povoado.
Ao chegar Joaquim com seus rebanhos, estava Ana à porta e ao vê-lo chegar, pôs-se a correr e atirou-se ao seu pescoço dizendo:
- Agora vejo que Deus me bendisse copiosamente, pois, sendo viúva, deixo de sê-lo e, sendo estéril, vou conceber em meu ventre.
Então Joaquim repousou naquele dia na sua casa.

V
No dia seguinte, ao ir oferecer as suas dádivas ao Senhor, dizia para consigo:
- Saberei se Deus me vai ser favorável se eu chegar a ver o éfode do sacerdote.
Ao oferecer o sacrifício, observou o éfode do sacerdote, quando este se acercava do altar de Deus e não encontrando pecado algum em sua consciência, disse:
- Agora vejo que o Senhor houve por bem perdoar todos os meus pecados.
Desceu Joaquim justificado do templo e foi para casa. O tempo de Ana cumpriu-se e no nono mês deu à luz.
Perguntou à parteira:
- A quem dei à luz?
A parteira respondeu:
- Uma menina.
Então Ana exclamou:
- A minha alma foi enaltecida - e reclinou a menina no berço.
Ao fim do tempo marcado pela lei, Ana purificou-se, deu o peito à menina e pôs-lhe o nome de Maria.

VI
Dia a dia a menina ia ficando mais robusta. Ao chegar aos seis meses, a sua mãe deixou-a só no chão, para ver se sustentava-se de pé. Ela, depois de andar sete passos, voltou ao regaço da sua mãe. Esta levantou-se, dizendo:
- Salve o Senhor! Não andarás mais por este solo, até que te leve ao templo do Senhor.
Fez-lhe um oratório em casa e não consentiu que nenhuma coisa vulgar ou impura passasse pelas suas mãos. Chamou, além disso, umas donzelas hebraicas, todas virgens, para que a entretivessem.
Quando a menina completou um ano, Joaquim deu um grande banquete, para o qual convidou os sacerdotes, os escribas, o sinédrio e todo o povo de Israel. Apresentou a menina aos sacerdotes, que a abençoaram assim:
- Ó Deus de nossos pais, bendiz esta menina e dá-lhe um nome glorioso e eterno por todas as gerações.
Ao que todo o povo respondeu:
- Assim seja, assim seja! Amem!
Apresentou-a também Joaquim aos príncipes e aos sacerdotes e estes a abençoaram assim:
- Ó Deus Altíssimo, põe os teus olhos nesta menina e outorga-lhe uma bênção perfeita, dessas que excluem as ulteriores.
A Sua mãe levou-a ao oratório da sua casa e deu-lhe o peito. Compôs, então, um hino ao Senhor Deus, dizendo:
- Entoarei um cântico ao Senhor meu Deus, porque me visitaste, afastaste de mim o opróbrio dos meus inimigos e deste-me um fruto santo, que é único e múltiplo a seus olhos. Quem dará aos filhos de Rubem a notícia de que Ana está a amamentar? Ouvi, ouvi, ó Doze Tribos de Israel: Ana está amamentar!
Tendo deixado a menina para que repousasse na câmara onde havia o oratório, saiu e pôs-se a servir os comensais. Estes, uma vez terminada a ceia, saíram regozijando-se e louvando ao Deus de Israel.

VII
Entretanto, os meses iam passando para a menina. Ao fazer dois anos, disse Joaquim a Ana:
- Levemo-la ao templo do Senhor para cumprir a promessa que fizemos, para que o Senhor não a reclame e a nossa oferenda se torne inaceitável a seus olhos.
Ana respondeu:
- Esperamos, todavia, até que complete três anos, para que a menina não tenha saudades de nós.
Joaquim respondeu:
- Esperaremos.
Ao chegar aos três anos, disse Joaquim:
- Chama as donzelas hebreias que não têm mancha e que tomem, duas a duas, uma candeia acesa e a acompanhem, para que a menina não olhe para trás e seu coração seja cativado por alguma coisa fora do templo de Deus.
Assim fizeram enquanto iam subindo ao templo de Deus. Lá recebeu-a o sacerdote, o qual, depois de tê-la beijado, abençoou-a e exclamou:
- O Senhor engrandeceu teu nome diante de todas as gerações, pois que, no final dos tempos, manifestará em ti a sua redenção aos filhos de Israel.
Fê-la sentar-se no terceiro degrau do altar. O Senhor derramou graças sobre a menina, que dançou cativando toda a casa de Israel.

VIII
Os seus pais, saíram então, cheios de admiração, louvando ao Senhor Deus porque a menina não havia olhado para trás. Maria permaneceu no templo como uma pombinha, recebendo alimento pelas mãos de um anjo.
Ao completar doze anos, os sacerdotes reuniram-se para deliberar, dizendo:
- Eis que Maria cumpriu doze anos no templo do Senhor. Que faremos para que ela não chegue a manchar o santuário?
Disseram ao sumo sacerdote:
- Tu que tens o altar ao teu cargo, entra e ora por ela. O que o Senhor te disser, isso será o que haveremos de fazer.
O sumo sacerdote, cingindo-se com o manto das doze sinetas, entrou no Santo dos Santos e orou por ela. Eis que um anjo do Senhor apareceu, dizendo-lhe:
- Zacarias, Zacarias, sai e reúne a todos os viúvos do povoado. Que cada um venha com um bastão e o daquele em que o Senhor fizer um sinal singular, deste será ela a esposa.
Saíram os arautos por toda a região da Judeia e, ao soar a trombeta do Senhor, todos acudiram.

IX
José, deixando de lado a sua acha, uniu-se a eles. Uma vez que se juntaram todos, tomaram cada qual seu bastão e puseram-se a caminho, à procura do sumo sacerdote. Este tomou todos os bastões, entrou no templo e pôs-se a orar. Terminadas as suas preces, tomou de novo os bastões e entregou os, mas em nenhum deles apareceu sinal algum. Porém, ao pegar José o último, eis que uma pomba saiu dele e se pôs a voar sobre sua cabeça. Então o sacerdote disse:
- A ti coube a sorte de receber sob tua custódia a Virgem do Senhor.
José replicou:
- Tenho filhos e sou velho, enquanto que ela é uma menina. Não gostaria de ser objecto de troça por toda a parte dos filhos de Israel.
Então tornou o sacerdote:
- Teme ao Senhor teu Deus e tem presente o que fez Ele com Datan, Abiron e Corê, de como abriu-se a terra e foram sepultados por sua rebelião. Teme agora tu também, José, para que não aconteça o mesmo a tua casa.
Ele, cheio de temor, recebeu-a sob protecção. Depois, disse-lhe:
- Tomei-te do templo. Deixo-te agora em minha casa e vou continuar as minhas construções. Logo voltarei. O Senhor te guardará.

X
Os sacerdotes, então, reuniram-se e concordaram em fazer um véu para o templo do Senhor.
O sumo sacerdote disse:
- Chama algumas donzelas sem mancha, da tribo de Davi.
Os ministros foram e depois de terem procurado, encontraram sete virgens. Então o sacerdote lembrou-se de Maria, a jovenzinha que, sendo de estirpe davídica, conservava-se imaculada aos olhos de Deus. Os emissários foram buscá-la.
Depois de as terem introduzido no templo, disse o sacerdote:
- Vejamos qual há de bordar o ouro, o amianto, o linho, a seda, o zircão, o escarlate e a verdadeira púrpura.
O escarlate e a verdadeira púrpura couberam a Maria que, tomando-as, foi para casa.
Naquela época, Zacarias ficou mudo, sendo substituído por Samuel, até quando pôde falar novamente. Maria tomou em suas mãos o escarlate e pôs-se a tecê-lo.

XI
Certo dia, pegou Maria um cântaro e foi enchê-lo com água. Eis que ouviu uma voz que lhe dizia:
- Deus te salve, cheia de graça! O Senhor está contigo, bendita és entre as mulheres!
Ela olhou à sua volta, à direita, à esquerda, para ver de onde vinha aquela voz. Tremendo, voltou para casa, deixou a ânfora, pegou a púrpura, sentou-se no divã e pôs-se a tece-la. Logo um anjo do Senhor apresentou-se diante dela, dizendo:
- Não temas, Maria, pois alcançaste graça ante o Senhor omnipotente e vais conceber por Sua palavra!
Ela, ao ouvi-lo, ficou perplexa e disse consigo mesma:
- Deverei eu conceber por virtude de Deus vivo e haverei de dar à luz como as demais mulheres?
Ao que lhe respondeu o anjo:
- Não será assim, Maria, pois que a virtude do Senhor te cobrirá com a sua sombra. Depois, o fruto santo que deverá nascer de ti será chamado de Filho do Altíssimo. Chamar-lhe-ás Jesus, pois Ele salvará o seu povo das suas iniquidades. Então, disse Maria:
- Eis aqui a escrava do Senhor em Sua presença. Que isto aconteça a mim conforme Sua palavra.

XII
Concluído o seu trabalho com a púrpura e o escarlate, levou-o ao sacerdote. Este a abençoou dizendo:
- Maria, o Senhor enaltece o teu nome e serás bendita entre todas as gerações da terra.
Cheia de alegria, Maria foi à casa da sua parente Isabel. Chamou-a da porta e, ao ouvi-la, Isabel largou o escarlate, correu para a porta, abriu-a e, vendo Maria, louvou-a dizendo:
- Que fiz eu para que a mãe do meu Senhor venha a minha casa? Pois saiba que o fruto que carrego em meu ventre se pôs a pular dentro de mim, como que para bendizer-se.
Maria havia-se esquecido dos mistérios que o anjo Gabriel lhe comunicara, elevou os olhos aos céus e disse:
- Quem sou eu, Senhor, para que todas as gerações me bendigam?
Passou três meses em casa de Isabel. Dia a dia o seu ventre aumentava e, cheia de temor, pôs-se a caminho de casa e escondia-se dos filhos de Israel. Quando sucederam essas coisas, ela contava dezasseis anos.

XIII
Ao chegar Maria ao sexto mês de gravidez, voltou José das suas construções e ao entrar em casa, deu-se conta de que ela estava grávida. Então, feriu seu próprio rosto, jogou-se no chão sobre uma manta e chorou amargamente, dizendo:
- Como é que me vou apresentar agora diante do meu Senhor? E que oração direi eu agora por esta donzela, pois que a recebi virgem do templo do Senhor e não a soube guardar? Será que a história de Adão se repetiu comigo? Assim como no instante em que ela estava glorificando a Deus veio a serpente e ao encontrar Eva sozinha, a enganou, o mesmo me aconteceu.
Levantando-se, José chamou Maria e disse-lhe:
- Predilecta como eras de Deus, como foste capaz de fazer isso? Acaso esqueceste o teu Senhor Deus? Com pudeste vilipendiar a tua alma, tu que te criaste no Santo dos Santos e recebeste alimento das mãos de um anjo?
Ela chorou amargamente dizendo:
- Sou pura e não conheço varão algum.
Replicou José:
- De onde, pois, provém o que carregas no ventre?
Ao que Maria respondeu:
- Pelo Senhor, meu Deus, eu juro que não sei como aconteceu.

XIV
José encheu-se de temor, retirou-se da presença de Maria e pôs-se a pensar sobre o que faria com ela. Dizia consigo próprio:
- Se escondo o seu erro, contrario a lei do Senhor. Se a denuncio ao povo de Israel, temo que o que acontecer a ela se deva a uma intervenção dos anjos e venha a entregar à morte uma inocente. Como deverei proceder, pois? Mandá-la embora às escondidas.

Enquanto isso, caiu a noite. Eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos, dizendo-lhe:
- Não temas por esta donzela, pois o que ela carrega nas suas entranhas é fruto do Espírito Santo. Dará à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus, pois que ele há de salvar o seu povo dos pecados.
Ao despertar, José levantou-se, glorificou a Deus de Israel por haver-lhe concedido tal graça e continuou guardando Maria.

XV
Por essa ocasião, veio à casa de José um escriba chamado Anás, que lhe disse:
- Por que não compareceste à nossa reunião?
Respondeu-lhe José:
- Estava cansado da caminhada e decidi repousar este primeiro dia.
Ao voltar-se, Anás deu-se conta da gravidez de Maria.
Então, correu ao sacerdote, dizendo-lhe:
- Esse José, por quem respondes, cometeu uma falta grave.
- Que queres dizer com isso? - perguntou o sacerdote. Ao que respondeu Anás:
- Pois violou aquela virgem que recebeu do templo de Deus, com a fraude do seu casamento e sem manifestá-lo ao povo de Israel.
Disse o sacerdote:
- Estás certo de que foi José que fez tal coisa?
Replicou Anás:
- Envia uma comissão e te certificarás de que a donzela está realmente grávida.
Saíram os emissário e encontraram-na tal qual havia dito Anás. Por isso levaram-na, juntamente com José, ante o tribunal.
O sacerdote iniciou, dizendo:
- Maria, como fizeste tal coisa? Que te levou a vilipendiar a tua alma e esquecer-te do Senhor teu Deus? Tu que te criaste no Santo dos Santos, que recebias alimento das mãos de um anjo, que escutaste os hinos e que dançavas na presença de Deus? Como fizeste isso?
Ela se pôs a chorar amargamente, dizendo:
- Juro pelo Senhor meu Deus que estou pura em sua presença e que não conheci varão.
Então o sacerdote dirigiu-se a José, perguntando-lhe:
- Por que fizeste isso?
Replicou José:
- Juro pelo Senhor meu Deus, que me encontro puro com relação a ela.
Acrescentou o sacerdote:
- Não jures em falso! Dizei a verdade! Usaste fraudulentamente o matrimónio e não o deste a conhecer ao povo de Israel. Não abaixaste a tua cabeça sob a mão poderosa de Deus, por quem a sua descendência havia sido bendita.
José guardou silêncio.

XVI
- Devolve, pois - continuou o sacerdote, - a virgem que recebeste do templo do Senhor.
José ficou com os olhos marejados em lágrimas. Acrescentou ainda o sacerdote:
- Farei com que bebais da água da prova do Senhor e ela vos mostrará, diante de vossos próprios olhos, vossos pecados.
Tomando da água, fez José bebê-la, enviando-o em seguida à montanha, de onde voltou são e salvo. Fez o mesmo com Maria, enviando-a também à montanha, mas ela voltou sã e salva.
Toda a cidade encheu-se de admiração ao ver que não havia pecado neles.
Disse o sacerdote:
- Posto que o Senhor não declarou vosso pecado, tampouco irei condenar-vos.
Então despediu-os. Tomando Maria, José voltou para casa cheio de alegria e louvado ao Deus de Israel.

XVII
Veio uma ordem do imperador Augusto para que se fizesse o censo de todos os habitantes de Belém da Judeia.
Disse José:
- A meus filhos posso recensear, mas que farei desta donzela? Como vou inclui-la no censo? Como minha esposa? Envergonhou-me. Como minha filha? Mas já sabem todos os filhos de Israel que não é! Este é o dia do Senhor, que se faça a sua vontade.
Selando sua asna, fez com que Maria se acomodasse sobre ela. Enquanto um de seus filhos ia à frente, puxando o animal pelo cabresto, José os acompanhava. Quando estavam a três milhas de distância de Belém, José virou-se para Maria e viu que ela estava triste.
Disse consigo mesmo:
- Deve ser a gravidez que lhe causa incomodo.
Ao voltar-se novamente, encontrou-a sorrindo e indagou-lhe:
- Maria, que se passa, pois algumas vezes vejo-te sorridente e outras triste?
Ela disse-lhe:
- É que apresentam-se dois povos diante dos meus olhos: um que chora e se aflige e outro que se alegra e regozija-se.
Ao chegar à metade do caminho, disse Maria a José:
- Desça-me, porque o fruto das minhas entranhas luta por vir à luz.
Ele ajudou-a a apear-se da asna, dizendo-lhe:
- Onde poderia eu levar-te para resguardar o teu pudor, já que estamos em campo aberto?

XVIII
Encontrando uma caverna, levou-a para dentro e havendo deixado os seus filhos com ela, foi buscar uma parteira na região de Belém.
Eis que José encontrou-se andando, mas não podia avançar. Ao levantar os seus olhos para o espaço, pareceu-lhe ver como se o ar estivesse estremecido de assombro. Quando fixou a vista no firmamento, encontrou-o estático e os pássaros do céu, imóveis. Ao dirigir o seu olhar à terra, viu um recipiente no solo e uns trabalhadores sentados em atitude de comer, com suas mãos na vasilha. Os que pareciam comer, na realidade não mastigavam, e os que estavam em atitude de pegar a comida, tampouco a tiravam do prato. Finalmente, os que pareciam levar os manjares à boca, não o faziam, ao contrário, tinham os seus rostos voltados para cima.
Também havia umas ovelhas que estavam sendo tangidas, mas não davam um passo. Estavam paradas. O pastor levantou sua destra para bater-lhes com um cajado, mas parou a sua mão no ar.
Ao dirigir o seu olhar à corrente do rio, viu como uns cabritinhos punham nela os seus focinhos, mas não bebiam. Em uma palavra, todas as coisas estavam afastadas, por uns instantes, do seu curso normal.

XIX
Então uma mulher que descia da montanha disse-lhe:
- Aonde vais?
Ao que ele respondeu:
- Ando procurando uma parteira hebreia.
Ela replicou:
- Mas és de Israel?
Ele respondeu:
- Sim.
- E quem é a que está dando à luz na caverna?
- É minha esposa.
- Então, não é tua mulher?
Ele respondeu:
- É Maria, a que se criou no templo do Senhor e ainda que me tivesse sido dada por mulher, não o é, pois que concebeu por virtude do Espírito Santo.
Insistiu a parteira:
- Isso é verdade?
José respondeu:
- Vem e verás.
Então a parteira pôs-se a caminho junto com ele. Ao chegar à gruta, pararam, e eis que esta estava sombreada por uma nuvem luminosa.
Exclamou a parteira:
- Minha alma foi engrandecida, porque os meus olhos viram coisas incríveis, pois que nasceu a salvação para Israel. De repente, a nuvem começou a sair da gruta e dentro brilhou uma luz tão grande que os seus olhos não podiam resistir. Esta, por um momento, começou a diminuir tanto que deu para ver o menino que estava tomando o peito da mãe, Maria. A parteira então deu um grito, dizendo:
- Grande é para mim o dia de hoje, já que pude ver com os meus próprios olhos um novo milagre.
Ao sair a parteira da gruta, veio ao seu encontro Salomé.
- Salomé, Salomé! - exclamou. - Tenho de te contar uma maravilha nunca vista. Uma virgem deu à luz; coisa que, como sabes, não permite a natureza humana.
Salomé replicou:
- Pelo Senhor, meus Deus, não acreditarei em tal coisa, se não me for dado a tocar com os dedos e examinar sua natureza.

XX
Havendo entrado a parteira, disse a Maria:
- Prepara-te, porque há entre nós uma grande querela em relação a ti.
Salomé, pois, introduziu seu dedo em sua natureza, mas, de repente, deu um grito, dizendo:
- Ai de mim! Minha maldade e minha incredulidade é que têm a culpa! Por descrer do Deus vivo, desprende-se de meu corpo a minha mão carbonizada.
Dobrou os joelhos diante do Senhor, dizendo:
- Ó Deus de nossos pais! Lembra-te de mim, porque sou descendente de Abraão, Isaac e Jacó! Não faças de mim um exemplo para os filhos de Israel! Devolve-me curada, porém, aos pobres, pois que tu sabes, Senhor, que em teu nome exercia minhas curas, recebendo de ti o meu salário!
Apareceu um anjo do céu, dizendo-lhe:
- Salomé, Salomé, Deus escutou-te. Aproxima a tua mão do menino, toma-o e haverá para ti alegria e prazer.
Acercou-se Salomé e tomou-o, dizendo:
- Adorar-te-ei, porque nasceste para ser o grande Rei de Israel.
De repente, sentiu-se curada e saiu em paz da gruta. Nisso ouviu uma voz que dizia:
- Salomé, Salomé, não contes as maravilhas que viste até estar o menino em Jerusalém.

XXI
José dispôs-se a partir para Judeia. Por essa ocasião, sobreveio um grande tumulto em Belém, pois vieram um magos dizendo:
- Aonde está o recém-nascido Rei dos Judeus, pois vimos a sua estrela no Oriente e viemos para adorá-lo?
Herodes, ao ouvir isso, perturbou-se. Enviou os seus emissários aos magos e convocou os príncipes e os sacerdotes, fazendo-lhes esta pergunta:
- Que está escrito em relação ao Messias? Aonde ele vai nascer?
Eles responderam:
- Em Belém da Judeia, segundo rezam as escrituras. Com isso, despachou-os e interrogou os magos com estas palavras:
- Qual é o sinal que vistes em relação ao nascimento desse rei?
Responderam-lhes os magos:
- Vimos um astro muito grande, que brilhava entre as demais estrelas e as eclipsava, fazendo-as desaparecer. Nisso soubemos que a Israel havia nascido um rei e viemos com a intenção de adorá-lo.
Replicou Herodes:
- Ide e buscai-o, para que também possa eu ir adorá-lo!
Naquele instante, a estrela que haviam visto no Oriente voltou novamente a guiá-los, até que chegaram à caverna e pousou sobre a entrada dela. Vieram, então, os magos a ter com o Menino e a sua mãe, Maria, e tiraram oferendas dos seus cofres: ouro, incenso e mirra.
Depois, avisados por um anjo para que não entrassem na Judeia, voltaram para as suas terras por outro caminho.

XXII
Ao dar-se conta Herodes de que havia sido enganado, encolerizou-se e enviou os seus sicários, dando-lhes a missão de assassinar todos os meninos de menos de dois anos.
Quando chegou até Maria a notícia da matança das crianças, encheu-se de temor e envolvendo o seu filho em fraldas, colocando-o numa manjedoura.
Quando Isabel se inteirou de que também buscavam a seu filho João, pegou-o e levou-o a uma montanha. Pôs-se a ver onde haveria de escondê-lo, mas não havia um lugar bom para isso. Entre soluços, exclamou em voz alta:
- Ó Montanha de Deus, recebe em teu seio a mãe com o seu filho, pois que não posso subir mais alto.
Nesse instante, abriu a montanha as suas entranhas para recebê-los. Acompanhou-os uma grande luz, pois estava com ele um anjo de Deus para guardá-los.

XXIII
Herodes prosseguia na busca de João e enviou os seus emissários a Zacarias para que lhe dissessem:
- Aonde escondeste teu filho?
Ele respondeu desta maneira:
- Eu me ocupo do serviço de Deus e encontro-me sempre no templo. Não sei onde está o meu filho.
Os emissários informaram Herodes de tudo o que se passara e ele encolerizou-se muito, dizendo consigo mesmo:
- Deve ser seu filho que vai reinar em Israel.
Enviou, então, um outro recado, dizendo-lhe:
- Diga-nos a verdade sobre onde está o teu filho, porque do contrário bem sabes que o teu sangue está sob as minhas mãos.
Zacarias respondeu:
- Serei mártir do Senhor, se te atreveres a derramar o meu sangue, porque a minha alma será recolhida pelo Senhor, ao ser cegada uma vida inocente no vestíbulo do santuário. Ao romper da aurora, foi assassinado Zacarias, sem que os filhos de Israel se dessem conta desse crime.

XXIV
Os sacerdotes reuniram-se à hora da saudação, mas Zacarias não saiu a seu encontro, como de costume, para abençoá-los. Puseram-se à espera para saudá-lo na oração e para glorificar o Altíssimo.
Ante a sua demora, começaram a ter medo. Tomando ânimo, um deles entrou, viu ao lado do altar sangue coagulado e ouviu uma voz que dizia:
- Zacarias foi morto e não se limpará o seu sangue até que chegue o vingador.
Ao ouvir a voz, encheu-se de temor e saiu para informar os sacerdotes que, tomando coragem, entraram e testemunharam o ocorrido. Então, os frisos do templo rangeram e eles rasgaram as suas vestes de alto a baixo.
Não encontraram o corpo, somente a poça de sangue coagulado. Cheios de temor, saíram para informar a todo o povo que Zacarias havia sido assassinado. A notícia correu em todas as tribos de Israel, que o choraram e guardaram luto por três dias e três noites.
Concluído esse tempo, reuniram-se os sacerdotes para deliberar sobre quem iriam pôr em seu lugar. Recaiu a sorte sobre Simeão, pois, pelo Espírito Santo, havia sido assegurado de que não veria a morte até que lhe fosse dado a contemplar o Messias Encarnado.

XXV
Eu, Tiago, escrevi esta história. Ao levantar-se um grande tumulto em Jerusalém, por ocasião da morte de Herodes, retirei-me ao deserto até que cessasse o motim, glorificando ao Senhor meu Deus, que me concedeu a graça e a sabedoria necessárias para compor esta narração.
Que a graça esteja com todos aqueles que temem a Nosso Senhor Jesus Cristo, para quem deve ser a glória.